«Divergente»

Shailene Woodley em Divergente. Foto: fandango.com.

Divergente na pretensão, mas uniforme na fórmula. É assim Divergente (2014), o novo filme de Neil Burger, que traz pouco de novo ao seu género. A história distópica passa-se numa cidade de Chicago arruinada (ficando-se sem saber o que levou a tal catástrofe), onde a sociedade está dividida em facções, de acordo com as suas virtudes: os Abnegados (altruísmo), Intrépidos (coragem), Cândidos (sinceridade), Eruditos (inteligência) e Cordiais (amizade), que são os que têm menos relevância no filme.

Beatrice Prior (Shailene Woodley) é uma jovem dos Abnegados que tem 16 anos e, por isso, precisa de fazer o teste de aptidão, necessário para perceber a que facção pertence. Só que descobre que tem aptidão para três qualidades, o que faz dela uma Divergente, considerada um perigo para uma sociedade que tem dificuldades em aceitar a diferença, num apelo à homogeneização. Beatrice resolve então escolher a facção dos Intrépidos sabendo, de antemão, que não poderá partilhar o seu segredo com ninguém…

Theo James e Shailene Woodley em Divergente. Foto: Out Now.

A narrativa passa-se maioritariamente na fase de treino de Tris (o novo nome da protagonista), o que pode tornar o filme algo maçudo e pouco entusiasmante. A realização de Burger até vai conseguindo recriar a ambiência sombria e temerária da história, mas não são transmitidas para o espectador as diversas sensações passadas no filme, como a claustrofobia e, mais abundantemente ao longo da obra, o medo, um dos elementos principais da narrativa. 

O filme peca sobretudo pela altura em que é lançado, quando a saga Os Jogos da Fome está em máxima força. São várias as semelhanças, mas Divergente perde na comparação, pois não consegue ter a mesma dimensão ideológica e conceptual, descambando em falta de carisma e pouco interesse narrativo. O elenco é também pouco iridescente, destacando-se apenas a segura e promissora protagonista (cujo potencial está muito pouco aproveitado na obra) e, claro, a sempre intocável Kate Winslet, que até num papel sem chama, como esta sua vilã, consegue brilhar. Relevância ainda para a fotografia, um aspecto cuidado e bem trabalhado, que ajuda na composição mais misteriosa do filme.

Kate Winslet em Divergente. Foto: Out Now.
O potencial de Divergente é, todavia, interessante, mostrando questões como a revolução social e política, a organização societária e o totalitarismo. Mas esta abordagem acaba por ser algo superficial e desaproveitada. Em vez disso, opta-se pelo enfoque no romance dos protagonistas que nem é particularmente envolvente ou magnetizável.
Divergente é a adaptação cinematográfica do primeiro livro da trilogia de Veronica Roth, pelo que este é ainda o primeiro passo de mais uma saga. O final é deveras o mais interessante da obra, deixando um bom prenúncio para aquilo que se poderá seguir. Mas, por si só, Divergente não chega para encantar verdadeiramente, sendo apenas um filme de entretenimento razoável, que decerto agradará aos mais jovens, mas não consegue abranger um público mais vasto.

(Crítica publicada na revista Metropolis de Maio de 2014: cinemametropolis.com)