«A Invenção de Hugo» e de um Oscar mal dado

Que me perdoem os fãs de O Artista (The Artist, 2011) pelo que aqui vou expor mas se houve filme injustiçado em 2011 foi A Invenção de Hugo (Hugo, 2011), com a derrota categórica nos Oscars do ano passado, tendo saído com 11 nomeações e "apenas" 5 estatuetas. E digo apenas porque foram referentes a categorias técnicas. No mínimo, o Oscar de Melhor Filme - por comparação com o vencedor, O Artista - tinha de ir para A Invenção de Hugo.

O Artista. Foto: cinemagia.ro

O ano de 2011 trouxe-nos para a contenda de melhor filme a grande luta a dois entre O Artista e A Invenção de Hugo. Dois filmes dedicados a homenagens ao cinema e à história da sétima arte, que, desde muito cedo, se colocaram na dianteira dos favoritos para o prémio de Melhor Filme. Desde muito cedo, também, que (admito que sem ter visto qualquer um dos dois filmes) via n'O Artista algo bastante sobrevalorizado, que a crítica havia elevado este filme a um estatuto que não era o seu. O de um filme que ganhou espaço numa espécie de panteão por ser "arrojado" no século XXI avançar para uma peça cinematográfica a preto e branco e muda.

Nada de mais errado, no meu ponto de vista. Sim, ganhou algum encanto por se tratar de um filme com essas características (mudo e a preto e branco), mas pouco mais. Verdade que sem estes "pormenores" tratar-se-ia de uma comédia romântica, de época, que retrata muito bem a dura realidade de uma geração de actores e fazedores de filmes aos quais se exigiu uma adaptação forçada a um novo elemento (o som e uma maior capacidade interpretativa). Vejo pouco mais em O Artista do que isto. Achava isto antes de ver o filme, achei-o depois e esta minha sensação acentuou-se a partir do momento em que tive a oportunidade de ver A Invenção de Hugo, já em 2013 e muito depois de O Artista.

A Invenção de Hugo (2011). Foto: moviejpg.com

A Invenção de Hugo devia ter vencido aquele Oscar de Melhor Filme. Se a intenção era premiar a história do cinema e, assim, homenagear uma arte em si, A Invenção de Hugo era a melhor escolha. Se a intenção era, efectivamente, escolher o filme do ano, a resposta é a mesma. A magia que o filme transmite, a beleza visual intrínseca do que nos é contado e do que podemos ver, a enorme realização de Scorsese (um verdadeiro génio!) e um argumento belíssimo... Tudo isto transporta-nos para uma realidade onde nos sentimos embrenhados, ao contrário d'O Artista.

Se d'A Invenção de Hugo não podemos retirar tanto das prestações individuais dos actores (embora ache que Jean Dujardin não tenha feito algo assim tão assinalável), não se pode esquecer a boa performance de Ben Kingsley, um dos grandes actores da sua geração. Muito do sonho transmitido pelo filme passa pelo seu George Méliès e pela sua história de vida.

Ao contrário d'O Artista, do qual poucas emoções e sensações consegui sentir, passando por mim quase como um filme banal, A Invenção de Hugo teve a mestria de me colocar naquele tempo, naquela realidade, na dura situação de Méliès, de um génio totalmente perdido com o tempo e com as vicissitudes de uma época pouco generosa para com os génios.

Acima de tudo, saí de Hugo com uma forte sensação interior de clara satisfação por ter visto um grande filme. Bonito (em todos os aspectos), com uma história forte sem ser demasiado dramática, fazendo passar com grande sucesso a ideia principal do filme: homenagear a vida e a obra de Méliès, mas acima de tudo transmitir a ideia de "sonho" e de concretização de sonhos.